EIXOS TEMÁTICOS:
Além de avaliar os trabalhos, o Comitê Científico encarregar-se-á
de organizar as mesas para as apresentações em Rodas de Diálogos de
acordo com os seguintes Eixos Temáticos[1].
1. A consciência é produto inacabado, de (re)elaboração constante
Paulo Freire[2]
“[...] a inconclusão que se reconhece a si mesma, implica necessariamente
a inserção do sujeito inacabado num permanente processo social de busca”
(Pedagogia da Autonomia, 1996, p. 61).
Mikhail Bakhtin[3]
“Os signos só emergem, decididamente, do processo de interação entre
uma consciência individual e uma outra. E a própria consciência individual
está repleta de signos. A consciência só se torna consciência quando
se impregna de conteúdo ideológico (semiótico)”
(Marxismo e Filosofia da Linguagem, 1981, p. 34).
João Wanderley Geraldi
“Ao defenderem o ponto de vista de que a consciência é produto do trabalho,
não preexiste ao próprio trabalho e ao convívio com os outros,
à internalização dos signos sociais, sempre ideológicos,
que somente se tornam do sujeito à medida que não lhes pertencem,
mas pertencem a um conjunto social, ambos os autores remetem ao
papel de retomo da consciência socialmente constituída:
a possibilidade de acção dos sujeitos, fundada em sua prépria
incompletude, donde uma concepção de sujeito agentivo e não
meramente passivo diante dos mecanismos de sua constituição
social. Talvez possamos adiantar que a aposta bakhtiniana é na
constituição sígnica da consciência, por natureza material e social,
que resulta dos processos interativos de que tomamos parte e que
por isso mesmo está sempre em constituição; a aposta de Paulo Freire
é na constituição de diferentes níveis de consciência em função dos
processos políticos de conscientização. Mas esta diferença está
a ainda ser perseguida por estudos mais aprofundados” (GERALDI, p.46/47).
2. O futuro como centro de gravidade das decisões do presente
Paulo Freire
“Reconhecer que a História é tempo de possibilidade e não de determinismo,
que o futuro, permita-se-me reiterar, é problemático e não inexorável.”
(Pedagogia da Autonomia, 1996, p. 21)
Mikhail Bakhtin
“Se eu mesmo sou um ser acabado e se o acontecimento é algo acabado,
não posso nem viver nem agir: para viver, devo estar inacabado, aberto
para mim mesmo — pelo menos no que constitui o essencial da minha vida
- devo ser para mim mesmo um valor ainda por-vir, devo não coincidir
com a minha própria atualidade.” (O autor e o herói, 1992, p.33)
João Wanderley Geraldi
“No mundo dos acontecimentos da vida, campo próprio do acto ético,
estamos sempre inacabados, porque definimos o presente como consequência
de um passado que construiu o pré-dado e pela memória do futuro com
que se definem as escolhas no horizonte de possibilidades. Nosso
acabamento atende a uma necessidade estética de totalidade, e esta
somente nos é dada pelo outro, como criação e não como solução.
A vida, concebida como acontecimento ético aberto, não comporta
acabamento e, portanto, não comporta solução e fixidez. Está na
incompletude a energia geradora da busca da completude eternamente
inconclusa. Os dois autores fazem a sua aposta no futuro: as utopias
de Paulo Freire; a memória de futuro de Mikhail Bakhtin.
Na arquitectura de suas reflexões, estas apostas somente
fazem sentido considerado o inacabamento do ser humano e a sua
relação com a alteridade como forma de sua própria construção.
Em Bakhtin não se encontra directamente a defesa de um futuro
visualizado a partir do presente, em outras obras poderemos
complementar as passagens aqui estudadas, especialmente em
função da defesa que faz o autor da responsabilidade do artista
e a defesa de construção de um mundo ético. Em Paulo Freire a filiação
a sonhos politicamente compartilhados é extremamente explícita,
e certamente releva de seu trabalho militante [...]” (GERALDI, p. 48).
3. O diálogo, forma privilegiada de relação com a alteridade: o sujeito se faz com o outro
Paulo Freire
“O sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto
a relação dialógica em que se confirma como inquietação e curiosidade,
como inconclusão em permanente movimento na História”
(Pedagogia da Autonomia, p.154).
Mikhail Bakhtin
“[...] toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo
fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para
alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor
e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro.
Através da palavra, defino-me em relação ao outro, isto é, em última
análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de ponte
lançada entre mim e os outros. Se ela se apoia sobre mim numa
extremidade, na outra apoia-se sobre o meu interlocutor. A palavra
é o território comum do locutor e do interlocutor” (Marxismo e
Filosofia da Linguagem, 1981, p. 113).
João Wanderley Geraldi
“Dialogia e alteridade são os dois pilares sobre que assentam
as reflexões dos dois autores em estudo. Obviamente defender a
dialogia enquanto relação entre um eu e um tu, não quer dizer
defender o consenso ou defender que todo o diálogo se faz
harmoniosamente. Ao contrário, ambos os autores reconhecem que
há polémica, há lutas de classes, há interesses antagónicos
entre as partes em diálogo. No entanto, ambos defendem que um
e outro polo se constituem concomitantemente, um polo não existe
sem o outro. Paulo Freire, em certa passagem da Pedagogia do
Oprimido defende que a libertação do oprimido é também a libertação
do opressor. Mikhail Bakhtin explicitamente afirma que “classe
social e comunidade semiótica não se confundem. (GERALDI, p.50)
4. Linguagem: função constitutiva dos sujeitos, que é ao mesmo tempo própria e alheia[4]
Paulo Freire[5]
“A existência, por ser humana não pode ser muda, silenciosa [...]. Existir,
humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo. O mundo pronunciado,
por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a
exigir deles novo pronunciar. Não é no silêncio que os homens se
fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão” (Pedagogia do
Oprimido, 2015, p. 108).
“A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior
leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele.
Linguagem e realidade se prendem dinamicamente” (Importância do ato de ler, 1989, p.9).
Mikhail Bakhtin[6]
“Quando a atividade mental se realiza sob a forma de enunciação, a
orientação social à qual ela se submete adquire maior complexidade
graças à exigência da adaptação ao contexto social imediato do ato
da fala, e, acima de tudo, aos interlocutores concretos”(Marxismo
e Filosofia da Linguagem, 2006, p.120).
“A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema
abstrato de formas linguísticas, nem pela enunciação monológica isolada,
nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno
social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das
enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental
da língua” (Marxismo e Filosofia da Linguagem, 2006, p.125).
João Wanderley Geraldi
Paulo Freire inúmeras vezes chama a atenção para a importância do processo
comunicativo e para as formas da linguagem nestes processos. Ao defender
que a leitura do mundo é anterior à leitura da palavra, não ignorou que
o mundo é lido através de nossas compreensões e estas não se dão no vazio,
mas na experiência social, no convívio com o mundo e com os outros:
expressa-se em linguagem (GERALDI, p.14).
De modo extremamente resumido podemos dizer que a linguagem, tanto
para Paulo Freire quanto para Bakhtin, tem uma função constitutiva
do sujeito. Os autores compartilham um ponto de partida: a dialogia
como espaço de construção do humano. Não há diálogo sem a construção
de recursos expressivos, através dos quais pensamentos são organizados
e expostos, compreendidos e modificados (GERALDI, p. 14).
Para Bakhtin, a linguagem é constitutiva da consciência e de toda
atividade mental. O sujeito constitui-se nas interações de que participa.
Bakhtin estuda a relação da consciência com o sistema de signos, e
também passa pela questão das atividades mentais do eu e as atividades
mentais do nós (GERALDI, p.15).
É graças à indeterminação relativa dos significados que a linguagem
torna possível a interlocução, o ato singular da enunciação e,
ao mesmo tempo, possibilita que o singular tenha interferência
nas generalizações, pois os significados não saem incólumes de
seus usos (GERALDI, p.16).
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A divulgação dos trabalhos aceitos ocorrerá a partir do dia 30/07/2017, via e-mail.
NOTAS:
[1] Trechos extraídos de: GERALDI, João Wanderley. Paulo Freire e Mikhail
Bakhtin: O encontro que não houve. In: CORTESÃO, Luíza et al.
Diálogos através de Paulo Freire. Colecção Querer Saber 1.
Porto: Edição Instituto Paulo Freire de Portugal e Centro
de Recursos Paulo Freire da FPCE, 2003/2004, p.37-52.
[2] FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Saberes necessários
à prática educativa. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 1996.
[3] BAKHTIN. Mikhail (Voloshinov, V.) Marxismo e filosofia da linguagem.
São Paulo, Hucitec, 1981 (original de 1929) / O Autor e o Herói.
In: Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
[4] Trechos extraídos de GERALDI, João W. A linguagem em
Paulo Freire. Educação, Sociedade e Culturas, n. 23, 2005,
p.7-20.
[5] FREIRE, Paulo. Importância do ato de ler: em três artigos
que se completam. 23ed. São Paulo, Autores Associados, Cortez, 1989.
_____Pedagogia do Oprimido. 59ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 2015.
[6] BAKHTIN. Mikhail (Voloshinov, V.) Marxismo e filosofia da linguagem.
12ed. São Paulo, Hucitec, 2006.
SUBMISSÃO DE TRABALHOS/ MAIORES INFORMAÇÕES:
- Submissão e incrição: 15 DE MARÇO - 30 DE JUNHO
- Divulgação: 30 DE JULHO
- bakhtinpaulofreirejc@gmail.com
- dialogospaulofreire.wixsite.com/dialogos2017
REALIZAÇÃO E APOIO
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